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quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Dama do candomblé

Em 18 de outubro de 1998, a comunidade do Ilê Iyá Omin Axé Iyamassê, e por extensão todo o povo-de-santo da Bahia e do Brasil, perdia a iyalorixá Cleuza Millet, primogênita de mãe Menininha do Gantois (1894-1986), que a substituiu no trono sacerdotal daquela casa de 1989 até o já referido ano de sua morte. Iyá Cleuza pertenceu à grande dinastia de mulheres negras que compuseram um dos mais importantes legados religiosos de herança africana no Brasil: o Axé Gantois.

Desde criança, ela demonstrou uma forte personalidade e se construiu como mulher fora de muitos padrões seguidos e impostos a pessoas que tinham a sua condição étnica, sexual e social. Impressionava a todos com a força de suas decisões, determinação e, de certa forma, com as transgressões que cometeu ao longo de sua vida, em nome de muitos avanços que gerou para si e para sua família consangüínea e espiritual. Ela nasceu na Cidade da Bahia, em 1923, e já em finais de 1938, aos 15 anos, chamou a atenção da pesquisadora estadunidense Ruth Landes, que viu na jovem uma outra possibilidade de exercício de feminilidade e de independência em relação ao forte domínio exercido pelos homens desta nossa terra naquelas épocas.

A sua trajetória de vida a fez morar por 18 anos no Rio de Janeiro, onde teve seus três filhos, só retornando a viver no Gantois no começo dos anos 1960, quando começou ao lado da mãe Menininha, então já prestigiosa iyalorixá entre nós, a cuidar liturgicamente do complexo universo religioso daquele candomblé. Além de ebomy e braço direito da mãe, obrigou-se a estudar fazendo o curso técnico de obstetriz, na Faculdade de Medicina da Bahia. Trabalhou também como bancária, e foi, de fato, como havia previsto Ruth Landes em seu livro A cidade das mulheres, um exemplo feminino de independência e rigor litúrgico que deu continuidade aos ensinamentos ancestrais de D. Maria Júlia da Conceição Nazareth, sua tataravó e fundadora do Terreiro do Gantois.

Mãe Cleuza corporificou a imagem das mulheres altivas e determinadas, circunscritas na esfera das religiões afro-brasileiras, inteligentes e políticas, estudadas, que levaram para o sacerdócio suas experiências como cidadãs, impondo-se como mulheres negras do candomblé, dialógicas e proponentes de outras práticas que negassem o forte racismo existente em Salvador e em todo o Brasil. Ela se representa assim ao lado da grande Stella de Oxóssi, e de sua própria irmã caçula, mãe Carmem de Oxaguian, sucessora de Cleuza e atual iyalorixá do Gantois.

Neste mês de julho, precisamente no último domingo (amanhã), o Gantois festeja a orixá Nanã, senhora dos mistérios da vida e da morte, dos lamaçais, orixá que regia a cabeça de Cleuza, e ela como uma das damas soberanas daquela casa, na figura da sua orixá, também é relembrada e saudada por sua comunidade religiosa. Gente-de-santo não morre, sublima-se.

FONTE: Jornal A TARDE

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