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quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Batuque digital nos terreiros do Eng. Velho da Federação

Terreiros do Engenho Velho da Federação contarão, a partir de agosto, com três infocentros para jovens carentes do bairro, graças a uma parceria firmada com universidades, governo e fundações culturais. O Programa Roda Baiana, que teve mais uma etapa inaugurada ontem, promoverá aulas de informática para estudantes do Engenho Velho, dando continuidade a uma iniciativa - em atividade - que prepara alunos negros para a inserção no ensino superior.

"Esta é a segunda etapa do Roda Baiana, a próxima será a de capacitação profissional para o mercado de trabalho", explicou Karine Limeira, uma das coordenadoras do projeto. Os terreiros do Cobre, Tanuri Junçara e Bogum, das nações Ketu, Angola e Jeje, respectivamente, ganharam seis computadores, cada um, e deverão contar com monitores contratados durante as aulas, em três turnos diários. Os centros terão conexão rápida, com acesso à internet.

Arraigada nas tradições do candomblé, mãe Val, ialorixá do Terreiro do Cobre, vê a chegada da tecnologia digital sem muito estardalhaço. Ela cedeu uma de suas salas para a instalação dos equipamentos, que não deverão comprometer as atividades religiosas da casa. "Será mais uma experiência, dentre tantas aqui no bairro, além de nos possibilitar trabalhar com outros terreiros, nos fortalecer", diz.

Numa comunidade que reúne anualmente caminhadas contra a intolerância religiosa, como gosta de frisar Karine, a união dos terreiros é uma forma de autodefesa. Mães-de-santo e fiéis do candomblé, caracterizados pela cor branca da sexta-feira, se reuniram ontem em torno dos rituais típicos, desta vez por uma causa nobre. "Num bairro como o nosso, onde o jovem é exposto à violência, precisamos mostrar alternativas para ele", disse mãe Val.

não é lan house - Bem-humorada, a makota Valdina de Oliveira Pinto, considerada liderança religiosa do Engenho Velho, preferiu dar logo seu recado. "Isso aqui não vai ser lan house", decretou, dedo em riste e autoridade de matriarca. Para ela, a importância de se "trabalhar para o mercado de trabalho, não somente tirando o jovem da rua e da marginalidade", sobrepõe o uso do computador para a diversão despropositada. Ou seja, nada de jogos de luta e tempo perdido em páginas de relacionamento, como o Orkut.

Responsável pela doação dos computadores, o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) pretende trabalhar com software livre, mas o coordenador de inclusão digital da Bahia, Jorge Vasconcelos, admite encontrar alguma resistência, por se tratar de uma configuração diferente da habitualmente implantada nas empresas. "Nosso objetivo é doar outras máquinas consideradas ociosas, beneficiar outros projetos", disse.

"A orientação atual é que empresas públicas doem estas máquinas a entidades filantrópicas ou instituições que tenham um trabalho social importante", esclareceu o coordenador de inclusão digital.

FONTE: Jornal A TARDE

Cristo, Axé e Maomé

No quarto século da nossa era, Agostinho de Hipona escreveu mais ou menos assim: "Ser humilde com quem é arrogante, firme com quem é pusilânime, doce com quem é amargo, decidido com os indecisos, manso com os irados, sereno com os agitados, equilibrado com os angustiados e, ai de mim, amar a todos". Agostinho continua sendo um baluarte da fraternidade. Guimarães Rosa disse que há o mundo do rio e o mundo da ponte. Construo pontes. Não de madeira, concreto ou aço, mas de sonhos. Material eterno e mais nobre.

Na primeira sexta-feira de julho, na missa da Igreja de São Lázaro entraram pessoas ligadas ao candomblé. Duas delas jovens, com roupas novas imaculadamente brancas e limpíssimas. Chegaram silenciosas, pacíficas e humildes e se colocaram de frente para o altar, em posição de prece maometana. Cristo, Axé e Maomé. O clima estava bom e ficou melhor. O silêncio ficou rico, lembrando um verso da minha juventude: "O silêncio infinito do grito de Deus". Passados alguns minutos, saíram tão ungidamente quanto tinham entrado.

O Dalai Lama disse que religião é para unir pessoas, colocá-las em comunhão; caso contrário, não merece este nome. Guerras ditas religiosas, cristãs, islâmicas, judaicas, tribais ou quaisquer outras são expressões do oposto. A religião deve ocupar-se com o Bem, e não com "os bens", como fazem tantas imposturas por aí.

Mudando de assunto no gancho do axé, que significa algo como "graça", o contrário de "desgraça", se não me engano em iorubá, a dívida que a cultura moderna da Bahia tem para com a chamada "axé music" é inestimável. Incluo no pacote a linha afro e a linha, digamos, branca, que de branco mesmo tem pouco.

Entre os muitos benefícios, cito o desenvolvimento da percussão em uma infinidade de levadas diferentes, ricas e criativas, que têm impressionado o mundo, a criação de um imenso campo de trabalho internacional para jovens que, de outro modo, dificilmente teriam uma ocupação decente, a elevação do nível técnico e artístico de uma grande quantidade de músicos (guitarristas, arranjadores, baixistas, tecladistas, saxofonistas, trompetistas, trombonistas e outros), habilitando-os profissionalmente e possibilitando-lhes a aquisição de instrumentos e equipamentos periféricos "de ponta", o que acaba beneficiando o meio musical como um todo.

Percussionistas e outros músicos do chamado "axé" têm atuado como multiplicadores em muitas escolas, centros comunitários, grupos paralelos, estúdios de ensaio e gravação, etc. De outro lado, o núcleo de orquestras juvenis e infantis do Teatro Castro Alves, também com um trabalho brilhante na formação de músicos, via outra linguagem não menos importante, embora mais impopular ainda. Tudo isso com muitas ligações diretas e indiretas com a grande mãe, a Escola de Música da Universidade Federal da Bahia.

FONTE: Jornal A TARDE

Dama do candomblé

Em 18 de outubro de 1998, a comunidade do Ilê Iyá Omin Axé Iyamassê, e por extensão todo o povo-de-santo da Bahia e do Brasil, perdia a iyalorixá Cleuza Millet, primogênita de mãe Menininha do Gantois (1894-1986), que a substituiu no trono sacerdotal daquela casa de 1989 até o já referido ano de sua morte. Iyá Cleuza pertenceu à grande dinastia de mulheres negras que compuseram um dos mais importantes legados religiosos de herança africana no Brasil: o Axé Gantois.

Desde criança, ela demonstrou uma forte personalidade e se construiu como mulher fora de muitos padrões seguidos e impostos a pessoas que tinham a sua condição étnica, sexual e social. Impressionava a todos com a força de suas decisões, determinação e, de certa forma, com as transgressões que cometeu ao longo de sua vida, em nome de muitos avanços que gerou para si e para sua família consangüínea e espiritual. Ela nasceu na Cidade da Bahia, em 1923, e já em finais de 1938, aos 15 anos, chamou a atenção da pesquisadora estadunidense Ruth Landes, que viu na jovem uma outra possibilidade de exercício de feminilidade e de independência em relação ao forte domínio exercido pelos homens desta nossa terra naquelas épocas.

A sua trajetória de vida a fez morar por 18 anos no Rio de Janeiro, onde teve seus três filhos, só retornando a viver no Gantois no começo dos anos 1960, quando começou ao lado da mãe Menininha, então já prestigiosa iyalorixá entre nós, a cuidar liturgicamente do complexo universo religioso daquele candomblé. Além de ebomy e braço direito da mãe, obrigou-se a estudar fazendo o curso técnico de obstetriz, na Faculdade de Medicina da Bahia. Trabalhou também como bancária, e foi, de fato, como havia previsto Ruth Landes em seu livro A cidade das mulheres, um exemplo feminino de independência e rigor litúrgico que deu continuidade aos ensinamentos ancestrais de D. Maria Júlia da Conceição Nazareth, sua tataravó e fundadora do Terreiro do Gantois.

Mãe Cleuza corporificou a imagem das mulheres altivas e determinadas, circunscritas na esfera das religiões afro-brasileiras, inteligentes e políticas, estudadas, que levaram para o sacerdócio suas experiências como cidadãs, impondo-se como mulheres negras do candomblé, dialógicas e proponentes de outras práticas que negassem o forte racismo existente em Salvador e em todo o Brasil. Ela se representa assim ao lado da grande Stella de Oxóssi, e de sua própria irmã caçula, mãe Carmem de Oxaguian, sucessora de Cleuza e atual iyalorixá do Gantois.

Neste mês de julho, precisamente no último domingo (amanhã), o Gantois festeja a orixá Nanã, senhora dos mistérios da vida e da morte, dos lamaçais, orixá que regia a cabeça de Cleuza, e ela como uma das damas soberanas daquela casa, na figura da sua orixá, também é relembrada e saudada por sua comunidade religiosa. Gente-de-santo não morre, sublima-se.

FONTE: Jornal A TARDE

Obá de Xangô nos braços de Olorun

A notícia relâmpago - morte de Caymmi - veio no tapete mágico voador. Perdida na contemplação do pé de damas-da-noite, transportei-me ao velho Opô Afonjá de Mãe Senhora dos grandes e inesquecíveis obás, os ministros de Xangô, já nos braços de Deus-Olorun: Jorge Amado, Miguel Santana, Camafeu de Oxóssi, Dmeval Chaves, Carybé... Agora Dorival Caymmi, o menestrel vanguardeiro.

Mãe Aninha, a fundadora do Axé, auxiliada por Martiniano Eliseu do Bonfim, criara, nos 1930, o corpo de obás: os ministros de Xangô, responsáveis pelos caminhos de seu candomblé de São Gonçalo do Retiro. Quase duas décadas mais tarde, sua filha espiritual Mãe Senhora de Oxum introduziu os "otum" e "ossi" de cada obá de Xangô. Otum significa direita; ossi,
esquerda, o que é freqüente
na complexa hierarquia dos
terreiros. São os assessores imediatos.

São 12 os obás-ministros de Xangô, o orixá da justiça e poder em exercício, o mais popular do panteão das divindades nagôs: obá aré, obá abiodum, obá cacanfô, obá telá, obá odofim, obá xorum, obá aressá, obá onikoiy, obá olubom, obá erim, obá onãxocum, obá arolu. Os primeiros seis são os chamados "obás da direita": com direito a voz e voto e, também, de tocar o xeré, sino sagrado de Xangô. Os demais são os "obás da esquerda", apenas com direito de voz; somente pegam os xerés na ausência dos primeiros. Não confundam os obás da direita e da esquerda com os "otum" e "ossi" de cada obá.

Dorival Caymmi era obá onikoiy, confirmado por Mãe Senhora há mais de quatro décadas. O cantor e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil é otum-obá onikoiy: com a morte de Caymmi, ascende ao posto de obá onikoiy. Os obás são escolhidos diretamente por Xangô: os responsáveis pela manutenção da tradição e guardiães dos bons costumes.

Conheci Caymmi no Axé, em meados dos 1980. O venerando obá ficou mais de 15 dias em São Gonçalo, passando a limpo sua vida espiritual. Era comum vê-lo tocando violão perto do velho pé de iroco, vizinho à casa de Xangô. Bati papos gostosos com o impressionante artista que, no terreiro, comportava-se como outro qualquer: especial por ser filho de Xangô e obá de Xangô, não mais do que semente que deu certo perto de cascata de águas límpidas.

Pela manhã, conversando com Mãe Carmem, a ialorixá do Gantois, por telefone, com saudade nos lembramos da famosa canção Oração de Mãe Meninha, cantada pelas grandes vozes da MPB. Mãe Carmem me relembrou que todos os filhos de Caymmi são iniciados no Gantois, no tempo de sua falecida mãe, daí os laços de obá onikoiy com a impressionante comunidade da Federação.

O orun está em festa. São muitos a receberem o menestrel de Xangô: Carybé, Jorge Amado, Camafeu, Mãe Senhora, Mãe Menininha, Carmen Miranda e tantos outros também sementes de primeira ao lado de um manancial de água cristalina. Olorun kossi purê obá onikoiy.

Cléo Martins | Agbeni Xangô do Axé Opô Afonjá

FONTE: Jornal A TARDE

Fiéis unem São Roque e Obaluaê


Fotos Eduardo Martins | Ag. A Tarde

Nunca o sincretismo religioso teve tanta força na festa em homenagem a São Roque e Obaluaê. Pela primeira vez, os rituais afros dividiram o altar com o culto católico durante missa celebrada em comemoração ao dia do santo, ontem, no Santuário de São Lázaro, no bairro da Federação. Toques de atabaques, agogôs e músicas do candomblé deram o tom da festa, na segunda missa do dia, realizada às 9h.

Nos anos anteriores, os adeptos do culto de matriz africana praticavam os rituais do lado de fora da igreja. O pároco Rosivaldo Mota diz que resolveu quebrar a tradição católica que restringia as missas de culto afro às primeiras segundas-feiras de cada mês, mas proibia a celebração no dia dedicado a São Roque, 16 de agosto.

"Fizemos uma pesquisa e constatamos que 99% dos devotos eram a favor da mudança. Estamos na Bahia e é importante aderir às duas culturas", afirma. O pároco diz que pretende seguir a experiência na festa em homenagem a São Lázaro, em janeiro.

Festa - Uma multidão de devotos vestida de branco, em sua maioria, se espremia dentro e fora da igreja que permaneceu lotada durante todo o dia. Muitos se emocionaram com a liturgia e também se embalaram ao ritmo de ijexá. "Está uma coisa linda. A missa de São Roque tem que ter axé. Acho que demoraram muito para unirem os dois cultos", comentou a servente Maria de Fátima Santos, 50 anos, que freqüenta o local há mais de 20 anos.

Com lágrimas nos olhos, a filha-de-santo Maria Augusta Santana, 31, não escondia a emoção. "Essa é uma igreja muito importante para o povo do candomblé. Não era justo que a gente ficasse do lado de fora no dia dele, já que todos somos devotos", disse.

Homenagem - As comemorações em homenagem a São Roque foram iniciadas às 5h, com alvorada e queima de fogos. Ao todo, foram realizadas quatro missas: às 7, 9, 11 e às 15 horas a celebração solene. Às 16 horas uma multidão seguiu em procissão pelas ruas do bairro.

Durante todo o dia, fiéis fizeram fila do lado de fora do santuário de São Lázaro na Federação para tomar o tradicional banho de pipoca. Gente que vinha para fazer pedidos, agradecer uma graça ou simplesmente louvar o santo caridoso que é protetor dos pobres, viúvas e dos órfãos.

O ritual é seguido pelo bancário André Fernandes, 36, há 29 anos. Ele conta que virou devoto de São Lázaro depois que ficou curado das crises de convulsões que nenhum médico soube diagnosticar o motivo. "Fui em vários médicos e nenhum deles resolveu o meu problema. Um medico espírita indicou a minha mãe que me trouxesse aqui para tomar um banho de pipoca e eu fiquei curado", lembra.

Já a professora Amália Conceição Barbosa, 40, diz que toma banho de pipoca apenas para afastar o mau olhado. "O banho traz energia", acredita.

Um dos tabuleiros mais disputados era o da mãe-de-santo, Janete Souza, 54 anos, que faz o ritual há mais de 20 anos. Para atender os devotos ela preparou mais de 30 quilos de milho de pipoca. Uma das mais antigas no local, a mãe-de-santo conta que teve seu pedido atendido por São Lázaro, mas que hoje também é devota de São Roque. "Minha filha ficou curada de um problema na perna depois que eu dei um banho de pipoca na porta desta igreja. A partir daí, nunca mais parei de dar banho".

Origem - A Festa de São Roque é de origem portuguesa, mas possui forte influência dos adeptos do candomblé, que reverenciam Obaluaê, divindade ligada à cura das doenças epidêmicas. Roque nasceu na cidade de Montpellier, no sudeste da França. Era filho de pais nobres. Em 1315, aos 20 anos de idade, os pais de Roque morreram, mas ele decide seguir Jesus Cristo, renegando os bens materiais e distribuindo-os entre os pobres.

Partiu de Montpellier em peregrinação a Roma e, durante o caminho, encontrou cidades infectadas pela peste negra e, como tinha formação médica, se ofereceu como enfermeiro. Contraiu a doença e curou-se milagrosamente. Morreu em 16 de agosto de 1327, aos 32 anos.

FONTE: Jornal A TARDE

Obra de Mestre Didi aquece debate artístico


FOTO ADQUIRIDA EM SITE DE BUSCA GOOGLE

A obra de Mestre Didi conseguiu reunir, em um seminário, realizado na capital baiana, especialistas brasileiros e estrangeiros das mais variadas áreas do conhecimento. Ontem, a dimensão simbólica da criatividade e da linguagem foi o tema dos debates que têm como ponto de partida o uso dos recursos criativos pelo sacerdote dos cultos africanos e um dos mais consagrados artistas brasileiros. Intitulado "Criatividade, âmago das diversidades culturaisa estética do sagrado", o seminário prossegue até hoje, no Hotel Pestana.

A atividade, organizada pela Sociedade de Estudos da Cultura Negra no Brasil ( Secneb), continua a celebração dos 90 anos de Mestre Didi, comemorados em dezembro do ano passado. Um dos debates realizados na manhã de ontem, acompanhado atentamente pelo homenageado, reuniu o escritor e diretor da Fundação Biblioteca Nacional, Muniz Sodré; o articulador junto a ONU e membro da Cátedra Indígena Itinerante, Marcos Terena, dentre outros convidados.

"Este seminário não é para falar sobre qualquer alguém, mas de um respeitado representante do povo nagô na Bahia. Mestre Didi deveria ser reverenciado nacionalmente por ser uma figura tão atuante e dono de uma criatividade que traduz a vivacidade de um povo do ponto de vista litúrgico, artístico, narrativo", disse Muniz Sodré.

Marcos Terena, da etnia indígena terena, originária da região do Mato Grosso do Sul, é também diretor do Memorial dos Povos Indígenas e membro do Comitê Intertribal (ITC). Ele destacou a proximidade entre a visão de mundo africana, que é tema da obra de Mestre Didi, com a guardada pelos povos indígenas.

terra - "Nós entendemos a terra como um lugar do qual somos inquilinos. Não somos donos no sentido de explorá-la, mas sim inquilinos que sabem como cuidá-la. Por isso ela é tão importante para nós, como é para os quilombolas", completa Terena.

Ele destaca que o impacto da colonização opressiva no Brasil começou sobre os povos indígenas e continuou atingindo os africanos trazidos como escravos. "Existem conexões que nos aproxima", acrescentou Terena.

Descóredes Maxilimiliano dos Santos, o Mestre Didi, é filho único de Maria Bibiana do Espírito Santo, a Mãe Senhora, que foi ialorixá do Ilê Axé Opô Afonjá, um dos mais conhecidos terreiros de candomblé de Salvador.

Mestre Didi é descendente da tradicional família Asipa, originária de Oyó e Ketu, cidades do império iorubá e que hoje estão em território pertencentes à Nigéria e República do Benim.

Ele é um alto sacerdote do culto aos ancestrais, dono também de títulos como o que recebeu em 1983: Obá Mobá Oni Xangô, dado pelo rei de Ketu. Por conta de suas atribuições sacerdotais, não se pronuncia em público, fora de um recinto religioso.

"Mestre Didi é um sábio e líder espiritual que tem feito da vida dele uma demonstração de como afirmar sua identidade sem nenhuma forma de agressão. A grande idéia sobre ele é a idéia da tolerância", destaca a socióloga e diretora da Secneb, Maria Brandão, moderadora do debate "Criatividade e a Comunicação Intercultural", que ocorre hoje.

FONTE:Jornal A TARDE

STJ condena Universal a indenizar mãe-de-santo


FOTO:Fernando Amorim / Agência A Tarde

Os herdeiros da ialorixá baiana Gildásia dos Santos e Santos, a mãe Gilda, ganharam mais um round da luta travada com a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou a igreja a indenizar os filhos e o marido da sacerdotisa do candomblé por danos morais.

Segundo profissionais da área de direito, é a primeira vez que o STJ decide sobre uma ação que envolve intolerância religiosa cometida por uma instituição. “O que temos ainda em andamento são processos em que indivíduos isolados cometem o crime. Mas, neste caso, a ação partiu de forma institucionalizada, ou seja, por um órgão pertencente à Iurd, no caso, a Folha Universal”, explica o promotor de justiça Almiro Sena. Ele é o titular da Promotoria de Justiça de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa, criada há 11 anos e de forma pioneira pelo Ministério Público da Bahia.

Pela decisão do STJ, os herdeiros, em conjunto, vão receber pouco mais de R$ 145 mil, cabendo R$ 20.750 para cada um. Segundo um dos advogados dos herdeiros, Maurício Araújo, o valor será corrigido, tendo como parâmetro o ano de 1999, quando aconteceu a ofensa. Desta forma, a indenização ficará em cerca de R$ 400 mil. Ainda cabe recurso de ambas as partes. Neste caso, o julgamento será feito pelo chamado “pleno” do tribunal. A atual sentença foi dada pela Quarta Turma.

O total fixado pelo STJ ficou abaixo da indenização de R$ 1,3 milhão estabelecida na sentença do juiz Clésio Rômulo, da 17ª Vara Cível da Bahia, em 2004. Um ano depois, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ) fixou um novo valor: R$ 960 mil.

“O valor dado pelo STJ está bem abaixo do que pretendíamos, mas comemoramos a condenação histórica. O STJ reconheceu a intolerância religiosa praticada pela Iurd”, explica Araújo. Segundo o advogado, os herdeiros apresentarão recurso para contestar o valor. “Vamos aguardar a publicação da sentença, que deve ocorrer a partir da próxima terça”, comenta.

Na avaliação de Maurício Araújo, o STJ seguiu uma padronização de valores que costuma adotar. “A meu ver, a indenização poderia ser mais alta por conta da peculiaridade do dano”, avalia Araújo. Em casos de danos morais, a legislação estabelece pisos específicos para evitar situações, como por exemplo, enriquecimento a partir da ação.

A TARDE entrou em contato com a assessoria de comunicação da Iurd, que fica em São Paulo. Foram obedecidas todas as exigências feitas pela assessoria para a obtenção de resposta da igreja – envio de e-mail formal, com detalhamento do assunto. Ao final do prazo, a assessoria informou que a direção da Iurd não deu nenhum tipo de resposta sobre o pedido da reportagem.

LUTA – A origem da ação judicial contra a Iurd foi a publicação, em 1999, de uma foto da mais alta sacerdotisa do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, localizado em Itapuã, numa reportagem da Folha Universal intitulada "Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes".

Mãe Gilda morreu de infarto em 21 de janeiro de 2000, um dia após assinar a procuração para a abertura do processo. “Minha mãe tinha a saúde fragilizada e piorou depois do choque de ver sua foto na reportagem”, conta a ialorixá Jaciara Santos, filha biológica e sucessora de mãe Gilda no comando do terreiro. Embora considere baixo o valor da indenização concedida pelo STJ, ela afirma que a decisão tem um forte simbolismo.

“Foram nove anos de luta, mas estou feliz por ver a Iurd condenada”, diz a ialorixá, que neste sábado, 20, participa de uma marcha contra a intolerância religiosa no Rio de Janeiro. Ela também participou de uma ação contra a intolerância religiosa realizada nesta sexta-feira, 19, em Salvador.

JURISPRUDÊNCIA – Para a coordenadora local da Koinonia, Jussara Rêgo, a decisão do STJ abre jurisprudência. “Embora a indenização tenha sido baixa, abriu-se a possibilidade de punição para casos semelhantes”, diz. A Koinonia é uma ONG que assessora comunidades como as dos terreiros.

O advogado Samuel Vida, professor da Ufba e da Ucsal, também elogia a decisão. “O reparo que faço é em relação ao valor da indenização. A política de fixação de valores irrisórios pelos tribunais reduz o efeito pedagógico da punição”, diz Samuel Vida, que é coordenador do Afro-Gabinete de Articulação Institucional e Jurídica (Aganju).

A batalha dos herdeiros de mãe Gilda tornou-se um símbolo da luta pela liberdade de culto em todo o Brasil. O dia da sua morte é a data nacional de combate à intolerância religiosa por meio de um projeto do deputado federal Daniel Almeida (PCdoB), que foi sancionado pelo presidente Lula no ano passado. A ação foi inspirada numa lei vigente em Salvador e que partiu da iniciativa da vereadora Olívia Santana (PCdoB).

FONTE: Cleidiana Ramos, do A TARDE

Alvorada dos ojás

No ano passado, nas comemorações do mês da Consciência Negra, surgiu a idéia de no dia do ato da 3ª Caminhada pela Vida e Liberdade Religiosa, organizada pelo Coletivo de Entidades Negras (CEN), fossem amarrados panos brancos (ojás) nas árvores do Dique dos Orixás, como o prefere chamar o povo de candomblé desta cidade. Sem as condições devidas naquele momento, protelamos o ato, mas não o esquecemos.

Montamos uma comissão que, percebendo os avanços da intolerância religiosa no País, resolveu fazer o ato neste 19 de setembro, dia do lançamento da 4ª Caminhada, e com uma tarefa ainda maior: colocar ojás em 21 bairros de Salvador. Daí foi uma batalha para conseguir três mil metros de tecido, montar as equipes com mais de 40 carros e 200 pessoas e varar a madrugada de quinta-feira com este fim.

Babá Pecê, Makota Valdina, Tata Hemetério, Ebomy Nice, Equede Lindinalva de Paula, Maria Leda e sua equipe das baianas, Tata Eurico, Marlene de Exu, Hamilton Ribeiro, mãe Jaciara, Dois Mundos, Iale, Bigode, Hamilton Borges e candidatos a vereador que são do candomblé, como Tâmara Azevedo, Raimundinho Kewanze, Vera Fonseca, Torres e Euclides, destacaram-se no apoio ao ato. O prefeiturável Hilton Coelho também.

A ação política tem fim específico, que é combater a intolerância religiosa e mostrar que amamos tanto as árvores que carregam as energias sagradas, as energias dos nossos ancestrais e as nossas forças, assim como o vento, a água, o fogo e tudo o que tem de sagrado e denominamos meio ambiente, pois somos de uma religião que tem fundamento na natureza.

A cidade amanheceu mais bonita e com um ar de curiosidade. No Abaeté, na orla, Dique, Garibaldi, Bonfim, Paralela, Centro, Vitória, Suburbana e outros locais. Muitos desejaram saber o significado das árvores amarradas com os ojás. Uns afirmaram que era um ato pela paz, e foi. Outros, contra o extermínio de jovens negros e o assassinato de policiais, e foi. Outros para abrir a mente dos políticos com relação a ações sérias para o povo de candomblé. Foi também.

Propomos ao Estado compreender a nossa história e as nossas raízes. É inaceitável demolir terreiros em Salvador, lacrar terreiros em São Paulo, fazer leis que impedem a nossa liberdade de culto no Rio Grande do Sul e tirar a guarda da criança a fim de evitar transtornos psíquicos, como aconteceu no Rio de Janeiro. Sabemos que a liberdade de crença é um direito constitucional.

O que fizemos foi mais um ato de amor do povo de candomblé ao povo de Salvador, da Bahia e do Brasil. Agora fica a questão: que tal nos amar também? Não custa nada e é bom para todo mundo. O amor é uma das melhores ações para melhorar o mundo. Que os orixás, inquices, voduns e encantados para sempre sejam louvados, e que Jeová, Jesus, Alá, Tupã, Buda, os irmãos de luz, também e para todo o sempre.

FONTE: Jornal A TARDE

Santo ou orixá?

Cosme e Damião já eram crescidos quando cuidavam das pessoas. Eles são cultuados desde o século 4, e suas imagens faziam referência a adultos. As atuais, que mostram duas crianças, vêm das mudanças pelas quais as religiões passaram no Brasil. Aqui já foi proibido ser de qualquer outra religião que não fosse o catolicismo.

Para escaparem da perseguição, os negros escravizados no Brasil associavam os seus deuses aos santos católicos. Oxossi era São Sebastião, Iansã era Santa Bárbara, Ibeji era São Cosme e São Damião. Assim, podiam cuidar de suas divindades fingindo que rezavam para santos da Igreja. Com o tempo, as religiões se misturaram, e uma influenciou a outra. Como Ibeji é um orixá criança, os santos viraram meninos. Em algumas imagens, a terceira criança que aparece é Idoú, irmão mais novo do gêmeos. Para o candomblé, três é um número sagrado. Na África, um dos gêmeos é mulher.


FONTE: Jornal A TARDE

Adeptos do candomblé vão às ruas pedir liberdade de culto

Branco para protestar. Na manhã de ontem, militantes em favor da liberdade religiosa e adeptos dos cultos de matriz africana usaram a cor de Oxalá não apenas nos trajes. Vestiram uma parte da cidade, da Praça da Sé à Lagoa do Abaeté, com os tecidos brancos utilizados nos rituais de candomblé, os ojás (colocados em locais sagrados). O objetivo foi exigir respeito e combater a intolerância religiosa, não apenas na cidade, mas em todo o Brasil. Por volta das 9h, o Coletivo de Entidades Negras (Cenbrasil) começou a Alvorada dos Ojás na Praça Municipal, junto à cajazeira centenária que fica ao lado do Memorial das Baianas e ao monumento da Cruz Caída, de Mário Cravo Júnior.

O grupo realizou um ato litúrgico no local. Baianas dançaram e músicos tocaram instrumentos usados nos rituais. "Viemos fazer um pedido aos nossos ancestrais, de força para resistir e lutar pela liberdade de religião", explicou Marcos Rezende, coordenador do Cenbrasil, conselheiro da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos e ogã do Terreiro Ilê Axé Oxumaré.

Também foi lido manifesto contra a intolerância e pela liberdade de culto, assinado por representantes de mais de mil terreiros de Salvador e outros 40 municípios baianos. O documento relembra o caso de Mãe Gilda. A demolição do Terreiro Oyá Unipó Neto, no bairro do Imbuí, em fevereiro, foi outro caso de agressão ao povo-de-santo citado pelo manifesto.

Marcos Rezende, que fez greve de fome em protesto quando o terreiro foi demolido, disse que este tipo de ataque precisa ser combatido não apenas na época de eleição: "Agora todo mundo fala em respeitar as diferenças entre as religiões, mas, quando a disputa por votos acaba, esquecem das promessas. O mapeamento dos terreiros de candomblé, por exemplo, deveria ser acompanhado da regularização fundiária dos locais, prometida pela prefeitura em regime de urgência. Até hoje o projeto está parado na Câmara de Vereadores", comentou.

O manifesto trata também de assuntos de outros estados. No Rio Grande do Sul, há a discussão de uma lei em defesa dos animais que, segundo o coletivo, inviabilizaria a liturgia dos cultos afro-brasileiros. Em São Paulo, um terreiro com mais de 25 anos foi lacrado pela prefeitura sob a alegação de mudança de zoneamento urbano e de que o barulho dos atabaques incomoda a vizinhança. No Rio de Janeiro, uma mulher adepta de cultos africanos chegou a perder a guarda do filho, porque a presença de imagens religiosas afetaria o desenvolvimento da criança.

A Alvorada dos Ajós também marcou o lançamento da quarta Caminhada Pela Vida e Liberdade Religiosa, que será realizada em 23 de novembro, saindo do Engenho Velho da Federação e indo até o Dique do Tororó.


FONTE:Jornal A TARDE

20/09/2008|